Por Digivets

Dezembro 3, 2024

gato abrigado infectado fiv e felv

A American Association of Feline Practitioners (AAFP) publicou em janeiro de 2020 no Journal of Feline Medicine and Surgery o último Guideline a respeito das retroviroses felinas, abrangendo o vírus da leucemia felina (FeLV) e o vírus da imunodeficiência felina (FIV). O documento é uma atualização do Guideline anterior sobre retrovírus felino da própria AAFP de 2008 e traz os conhecimentos atuais sobre diagnóstico, prevenção e manejo de infecções por retrovírus em felinos. 

Neste artigo iremos discutir sobre cuidados necessários com animais abrigados infectados por FIV e FeLV e ao se adotar esses bichinhos. Acesse nossos outros artigos voltados ao novo guideline sobre FIV e FeLV para saber mais:

Animais abrigados infectados FIV e FeLV 

Abrigos para animais, especialmente no Brasil, apresentam um aumento de demanda expressivo da comunidade, visando salvar e tratar animais em situação de rua, isso desafia os paradigmas tradicionais de controle animal que dependiam da eutanásia como controle populacional.  

No entanto, o número de pacientes admitidos em abrigos, especialmente durante a temporada de procriação, continua superando a capacidade de muitos abrigos. Essa questão exige uma constante reavaliação de protocolos e de alocações de recursos para alcançar os melhores resultados para animais dentro e fora dos abrigos. 

A guideline da Association of Shelter Veterinarians (ASV) declara que a proteção da saúde e bem-estar de animais abrigados requer vacinação contra infecções agudas com risco de vida, tratamento de parasitas, tratamento de doenças ou ferimentos, nutrição adequada, alojamento apropriado e cuidados comportamentais. Protocolos relativos a cuidados adicionais, como gerenciamento de retrovírus, devem ser elaborados com base na melhor alocação de recursos disponíveis para dar suporte às metas do abrigo e devem ser atualizados com base na medicina mais atual baseada em evidências.  

Essas decisões devem levar em conta alguns pontos como: investimento financeiro e de pessoal associado aos testes para infecções que geralmente têm baixa prevalência, a praticidade de testes adicionais, os resultados para gatos com teste positivo e as consequências de liberar gatos que podem ter infecções retrovirais.  

Cuidados necessários ao se adotar o animal de um abrigo 

A permanência de um animal em abrigo por longo período cria várias ameaças físicas e emocionais. O funcionamento do abrigo e o bem-estar animal são geralmente mais bem atendidos investindo recursos em apoiar a admissão definitiva do paciente no abrigo ou fazer a transição rápida do animal do abrigo para um lar permanente ou então de volta para a comunidade.  

Essa transição deve incluir a transferência de cuidados e histórico médico do abrigo para um veterinário de atenção primária na comunidade, que trabalhará com o tutor adotante para concluir qualquer procedimento de saúde preventiva necessário e estabelecer cuidados contínuos. 

A ASV recomenda que animais elegíveis para adoção ou realocação sejam examinados para FeLV e FIV. Esta triagem é fornecida antes da adoção em alguns abrigos, no entanto em muitas situações, os recursos e a infraestrutura do abrigo não contemplam testes de rotina em todos os animais disponíveis para adoção.  

Nesses casos, se os gatos forem alojados individualmente, os abrigos podem priorizar os testes em situações de alto risco, como pacientes doentes ou com feridas de mordida. No entanto, se os gatos não forem testados para infecção por retrovírus no abrigo, uma recomendação para testes pós-adoção deve ser claramente explicada ao adotante e documentada no arquivo do animal.  

O novo pet deve ser mantido separado dos outros até que seja devidamente testado e o resultado do teste seja conhecido. Embora na maioria dos casos os animais abrigados estejam livres de infecção, o teste pós-adoção poderá colocar os tutores frente a difíceis decisões sobre o que fazer com um gato recém-adotado que possui diagnostico positivo para uma infecção retroviral. 

Se um filhote em uma ninhada ou grupo for posteriormente testado como infectado, os adotantes dos outros gatos que sofreram exposição ao animal infectado devem ser notificados para que os gatos em contato possam ser monitorados e testados. 

Cuidados necessários ao incorporar um novo animal ao abrigo 

Embora a quantidade de pacientes em abrigos infectados com FIV e FeLV compactuem com as baixas taxas dos animais de estimação, milhares de animais infectados passarão em algum momento por abrigos. Por este motivo todo novo paciente em abrigo deve ser considerado como potencialmente infectado, independentemente de sua origem.  

Alojar gatos com histórico retroviral desconhecido em grupos deve ser estritamente evitado. Os retrovírus são transmitidos de forma eficiente por fluidos corporais contaminados, particularmente sangue e saliva. Por esse motivo, instrumentos cirúrgicos e odontológicos, agulhas, tubos endotraqueais e outros equipamentos potencialmente contaminados devem ser completamente desinfetados antes do uso no próximo paciente, mesmo que se trate de filhotes da mesma ninhada. 

Quando testar e/ou vacinar para FIV e FeLV os animais em abrigos? 

Tanto a infecção por FeLV quanto por FIV diferem de outras doenças infecciosas importantes em abrigos, como o vírus da panleucopenia felina, o calicivírus felino, o herpesvírus felino e o corona-vírus felino, porque os retrovírus são facilmente inativados com desinfecção de rotina e não são espalhados pelo ar ou pelo contato indireto.  

Devido ao baixo risco de transmissão, caso os pacientes sejam alojados separadamente, como na imagem 1 que segue abaixo, o teste para FeLV e FIV se torna opcional para esses animais e a vacinação contra FeLV ou FIV não é recomendada.  

No entanto, em instalações nas quais os pacientes são alojados em grupo, o teste de FeLV e FIV é essencial antes que entrem no grupo. Para animais que são alojados em grupo por longos períodos ou que vivem em santuários, o teste de FeLV e FIV e a vacinação contra FeLV são recomendados.  

A vacinação contra FIV não é recomendada em abrigos porque a transmissão de FIV entre companheiros que não lutam parece ser incomum, além disso o nível de imunidade induzida pela vacina é variável e os resultados positivos de teste para anticorpos FIV podem complicar a determinação futura do verdadeiro status de infecção por FIV dos pacientes vacinados. 

Imagem 1

RECOMENDAÇÕES DE TESTE E VACINAÇÃO PARA O VÍRUS DA LEUCEMIA FELINA (FELV) E PARA O VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA FELINA (FIV) PARA GATOS SAUDÁVEIS EM ABRIGOS DE ANIMAIS E LIVRES.  
SITUAÇÃO ANALISADA TESTE PARA FeLV/FIV  VACINAÇÃO CONTRA FeLV VACINAÇÃO CONTRA FIV 
Animais alojados em grupo por curto período Recomendada Não recomendada Não recomendada 
Animais adotivos Recomendada Opcional Não recomendada 
Animais alojados em santuários ou em grupos por longo período Recomendada Recomendada Não recomendada 
Animais capturados apenas para castração Não recomendada Não recomendada Não recomendada 
As recomendações para testes e vacinação contra FeLV e FIV para abrigos estão resumidas na tabela acima. Adaptado do AAFP Feline Retrovirus Testing and Management Guidelines, 2020. 

Procedimentos relacionados aos testes retrovirais em abrigos

Os custos dos testes podem ser minimizados utilizando programas de desconto de abrigos de fornecedores ou usando laboratórios de referência para efetuar o teste em várias amostras de uma vez. No entanto, a precisão pode variar entre testes e laboratórios, então o custo não deve ser a única consideração. Também não é apropriado economizar custos testando um paciente como representante dos outros de mesma ninhada ou grupo; práticas como testar apenas a mãe ou então somente alguns membros da ninhada não são confiáveis e um uso ruim de recursos.  

Os registros médicos do abrigo devem identificar individualmente cada gato e refletir com precisão os procedimentos de teste realizados e a marca do teste utilizada. Reunir várias amostras de sangue para serem testadas em um único teste laboratorial reduzirá a sensibilidade do teste e não deve ser realizado. 

Embora os testes para triagem sejam aconselhados em abrigos, a confirmação da infecção é um desafio maior porque muitos abrigos têm uma rápida rotatividade e recursos limitados. Custos maiores, atrasos e dificuldade na interpretação de resultados discordantes são razões pelas quais muitos abrigos não buscam testes adicionais para resultados positivos obtidos em testes ambulatoriais ou evitam completamente os testes.  

Um protocolo de teste simples, “um e pronto”, efetuado com um teste de triagem confiável poderá identificar a maior parte dos gatos infectados, as exceções seriam pacientes recentemente infectados, filhotes testados sem terem feito o desmame e filhotes com anticorpos para FIV ainda provenientes da mãe. Testes secundários, como PCR, são valiosos quando concordam com os resultados dos testes de triagem, mas nem sempre são capazes de esclarecer o status dos gatos quando se trata de resultados discordantes. 

A adoção consciente de animais infectados por FeLV e FIV

Nos últimos anos um número crescente de abrigos vem expandindo seus programas de adoção para incluir animais infectados por FeLV e FIV.  

Esses animais são mantidos em alojamentos individuais ou acomodações em grupo que os segreguem de outros não infectados pendentes de adoção.  

Abrigos também vem desenvolvendo programas de marketing e educação para incentivar a adoção desses animais e para garantir que recebam os cuidados pós-adoção de que necessitam. Esse fato é reforçado por diversos estudos que sugerem que gatos infectados podem coabitar pacificamente com FIV-negativos sem que ocorra transmissões.  

Em contrapartida, alguns estudos verificaram que a transmissão de FeLV dentro de lares parece ser mais comum do que se imagina, isso sugere que pacientes infectados com FeLV devem ser adotados em lares que tenham apenas outros animais infectados ou que sejam adotados por tutores sem outros felinos. Contudo, mesmo assim, a adoção em um ambiente doméstico pacífoco propiciará, sem dúvidas, melhores resultados a longo prazo para o felino. 

Referências 

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