Especialistas discutiram o ressurgimento da doença causada pela Cochliomyia hominivorax, que havia sido erradicada, e comentam sobre o que pode ser feito para conter seu novo avanço.
Um dos maiores sucessos no controle mundial de parasitas que causam prejuízo econômico para a pecuária está sob ameaça. A campanha de erradicação da mosca-da-bicheira (Cochliomyia hominivorax) na América do Norte e Central representa um dos capítulos mais bem-sucedidos da história da saúde animal. Mas o sucesso às vezes leva à falta de vigilância… e parece que foi isso que aconteceu com essa bem-sucedida inciativa.
Durante o primeiro dia de conferências do Congresso da WAAVP 2025 em Curitiba, um dos grandes destaques foi o Simpósio Boehringer Ingelheim “O que sabemos sobre os surtos de New World Screwworm (NWS) na América Central e México — e o que esperar daqui em diante?”

Neste evento, especialistas discutiram a recente ressurgência do problema, e as formas de enfrentar esse novo desafio. Surtos recentes na América Central e México acenderam o alerta para o risco de reintrodução em áreas já consideradas livres. Esses surtos estão associados ao trânsito de pessoas e animais e ao enfraquecimento das barreiras de vigilância.
Segundo o Pesquisador da EMBRAPA Gado de Corte – Dr. Thadeu Barros, ‘a atual fonte de reinfestação da Cochliomyia hominivorax não se deve a falhas remanescentes do programa de erradicação. Durante mais de 20 anos, a barreira sanitária no istmo de Darién funcionou como zona tampão: a cada nova entrada da mosca em áreas de floresta, os casos eram detectados e tratados rapidamente, impedindo a reprodução e a expansão da praga’.

Entretanto, a desmobilização da estrutura de vigilância e a redução de pessoal nas fábricas de produção de insetos estéreis fragilizaram o sistema. Aliado a isso, ocorreu uma redução da eficiência da cepa em uso para o controle no campo, e uma falta de recursos para situações emergenciais e limitações decorrentes da pandemia de COVID (afetando a importação de insumos e a vigilância na área da barreira de contenção). Quando novos focos começaram a surgir, a resposta foi tardia e insuficiente, permitindo que a mosca avançasse.
Segundo o pesquisador, a dispersão não ocorreu de forma natural, mas foi acelerada principalmente pelo transporte de gado e até pets acompanhando fluxos de imigrantes. O primeiro caso registrado na Costa Rica, por exemplo, foi em um cão de imigrantes que cruzavam a fronteira, ilustrando como a mobilidade humana acelerou a propagação da praga pela América Central.
O Professor Roger Ivan Rodríguez-Vivas, da Universidade Autônoma de Yucatan no Mexico, em sua exposição no simpósio reforçou que o transporte de indivíduos adultos através da fronteira teve um papel preponderante nessa ressurgência. Seja através de pessoas, animais de companhia ou de gado contrabandeado na fronteira, todos foram fatores fundamentais para essa nova onda de infestações. O professor ressaltou o grande esforço do governo mexicano em promover campanhas de educação dos pecuaristas, que por não terem mais contato com esse parasita há muito tempo, já não sabiam como lidar com o problema.
Segundo Gustavo Sabatini, Global Technical Leader de Ruminantes da Boehringer Ingelheim Animal Health, ”A Cochliomyia hominivorax sempre representou uma ameaça para a pecuária nas Américas. No entanto, desde a epidemia iniciada no final de 2022 na América Central, o parasita voltou a ganhar enorme relevância, provocando prejuízos significativos em países da região e no México, avançando em direção à América do Norte”.

Segundo o executivo, o cenário preocupa produtores e autoridades regulatórias, que enfrentam um desafio adicional: após décadas sem ocorrência da praga, muitos pecuaristas não reconhecem os sinais da infestação e desconhecem medidas de controle. E Sabatini ressalta: ‘além disso, não há produtos veterinários registrados atualmente com indicação específica em bula para prevenção e combate da miíase causada pela mosca”.
Diante desse quadro, cresce a expectativa sobre até onde a infestação poderá chegar. Especialistas alertam que a entrada da praga nos Estados Unidos é uma possibilidade real, o que já mobiliza o USDA e outras autoridades norte-americanas. O governo vem consultando empresas do setor sobre possíveis soluções, inovações e formas de acelerar registros de produtos capazes de auxiliar no controle da infestação.
Dentro desse cenário, o simpósio discutiu os riscos para a pecuária, o Impacto econômico direto: aumento nos custos de controle (inseticidas, tratamento de feridas, mão de obra) e perdas produtivas significativas na bovinocultura, ovinos, caprinos e equinos, o impacto sanitário: maior susceptibilidade de rebanhos a infecções secundárias, redução do bem-estar animal, barreiras ao comércio internacional e o Impacto estratégico: ameaça à segurança alimentar e ao patrimônio zoossanitário conquistado em décadas de programas de erradicação. Os especialistas ressaltaram a necessidade de manter programas regionais de vigilância, cooperação internacional e estratégias de biossegurança para evitar a reinfestação.
Para ficar por dentro de todas as novidades do mundo veterinário leia nossos outros artigos em:
Digivets
Quer uma curadoria de conteúdo no seu email?
Assine nossa News no LinkedIn Newsletter Digivets